segunda-feira, 23 de outubro de 2017

CARTA DE MAÉRCIO SIQUEIRA



O escritor, poeta e xilogravador Maércio Siqueira envia-nos, direto do Cratinho de Açúcar, um texto que escreveu sobre o livro SERTÃO EM DESENCANTO. Fiquei feliz e lisonjeado com as suas observações sobre uma obra que, a princípio, imaginei que fosse interessar apenas aos meus familiares, já que se trata de um relato vinculado à genealogia do meu clã familiar. 
Xilógrafo de reconhecido mérito e talento, Maércio foi escolhido para fazer a capa do II Volume de Memórias, intitulado NO TEMPO DA LAMPARINA
Pela capa magnífica e pelo texto enviado, só nos resta agradecer. Obrigado, Maércio.


A propósito do livro SERTÃO EM DESENCANTO Gênesis sertaneja – I Volume de Memórias, de Arievaldo Vianna

Máercio Siqueira

            É curioso que o autor de Sertão em Desencanto chame de Memórias a seu impressionante trabalho, quando boa parte das pessoas e dos acontecimentos de que trata o livro existiram ou aconteceram bem anteriores ao seu nascimento e alguns deles só localizados em virtude de exaustiva pesquisa. Como ter memória daquilo que não viveu? Deveria ser chamado História? Genealogia?
            Aqui está, creio eu, umas dos pontos interessantíssimos do livro. O autor segue uma feliz intuição e costura dados documentais, bibliográficos, depoimentos de familiares com suas próprias memórias. Aliás, o elã de todos os dados do livro é o próprio autor, para o qual converge, de modo descendente, o intricado sistema de acontecimentos históricos e contingências familiares.
            Não se trata de um livro escrito para salientar a pessoa do autor. Pelo contrário, ele se porta o mais discreto possível. Porém, não renuncia a sua condição de recriador de um mundo que, do contrário, estaria diluído, perdido em memórias individuais, em relatos esparsos em outros livros e documentos. É Arievaldo que traz para as próprias mãos os inúmeros fios ameaçados de se perderem no tempo e no espaço. Como, pois, juntar tudo isso, a não ser pelo princípio unificador da própria vida mental do autor? São suas lembranças, suas vivências passadas, essa memória tão cara de sua infância no sertão, que dá sentido a todo esse trabalho, tornando Arievaldo um historiador intuitivo e eficiente, e um erudito em matéria de vida e cultura sertanejas.


Xilogravura de Maércio Siqueira

            O que torna esse livro tão atraente é justamente esse alento de vida soprado sobre as figuras já desaparecidas. Na verdade, estão vivas! O autor o demonstra pela continuidade das suas raízes nos descendentes atuais. Mesmo os ocorridos do século XIX parecem estar diante de nossos sentidos, graças à paixão com que o escritor o descreve e narra. Em outras palavras, graças ao amor que dedica ao seu trabalho.
            Certamente o autor conseguiu dar a seu livro um elevado nível de objetividade, citando documentos, livros, etc. Contudo é a subjetividade de Arievaldo que se torna o sal de tudo isso. É por seus olhos que passamos a ver todos os eventos levantados. É por sua palavra que escutamos a voz daqueles que lhe falaram. É por suas mãos que abrimos a gaveta da escrivaninha da casa de seus avós e descobrimos ali o tesouro de literatura de cordel. É com seus pés que atravessamos as ruas de Quixeramobim acompanhado de sua avó Alzira, e ela nos mostrando a casa os pontos históricos da cidade. É com seus sentidos todos que vislumbramos o sertão em suas grandezas e detalhes. Por seu pesar, chegamos também a lamentar o desaparecimento daquele modo de viver, a contemplar o sertão em desencanto.
            Somos gratos ao autor por sua obra, por ter restaurado esse mundo encantado das suas lembranças.            Tratam-se, portanto de Memórias, pois são estas que condicionam a pesquisa e estruturam todas as informações adicionais que autor teve de buscar fora de suas reminiscências. Está em suas recordações a força que anima essa imenso corpo criado pela investigação e pela escrita dessas páginas preciosas.
            Pobres palavras para comentar de algo tão grande! Mas o livro fala por si mesmo e sua leitura não pode ser substituída por nenhum comentário, principalmente por este, que apenas se limitou a um enfoque bem limitado da obra.
Crato, 23/10/2017


Capa do II Volume de Memórias, que será
lançado em breve, com capa de Maércio.




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