AVOA, IMAGINAÇÃO!
Traduzido em cenas e canções, “O Romance do
Pavão Mysterioso”
ganha agora versão infantil
Malino que
nem menino, o poeta popular Arievaldo Viana inventara de atirar pedra em
enxame. Meteu-se em briga de cachorro grande o cearense de Quixeramobim. É que,
embora publicado há mais de 80 anos, o folheto “O Romance do Pavão Mysterioso”
rende debates acalorados ainda hoje. De autoria do paraibano José Camelo de
Melo Resende, o cordel acabou sendo impresso pela primeira vez levando a
assinatura de um outro autor: o também paraibano João Melchíades Ferreira da
Silva.
“O José Camelo
inventou a história do Pavão para ser cantada. Criou uma melodia até, mas não
chegou a imprimir. Aí, o João Melchíades teve acesso ao original e fez uma
versão. Na época o José Camelo tinha umas complicações com a polícia e não pôde
reclamar seus direitos, mas depois publicou seus originais e meteu o pau no
João Melchíades. Resultado: essa confusão continua rendendo”, comenta Arievaldo
Viana. Não bastasse o engodo já tradicional, o cearense pôs na veneta de
incrementar a polêmica ainda mais ao apresentar à meninada o causo de amor do
jovem Evangelista e a condessa Creusa.
Jô Oliveira e Arievaldo Vianna - parceria em mais de 10 livros
“O primeiro
‘O Romance do Pavão Mysterioso’ que conheci na vida foi o do João Melchíades.
Devo esse crédito a ele. Sei que o original é do José Camelo, mas, na verdade,
não sigo o estilo de nem um nem outro”, destaca o autor. De parelha com o
ilustrador pernambucano Jô Oliveira, Arievaldo Viana apresenta a seus leitores
miúdos uma narrativa nova. “A história continua atrativa. O José Camelo foi um
visionário. O cordel tem um pé na ficção científica que o deixa atual. O Pavão
é uma maleta que se aciona com um botão e vira um helicóptero. Então, as
crianças embarcam na fantasia facilmente. O que mudei foi só a linguagem.
Reduzi a quantidade de texto e inclui novos personagens”, pontua. Com isso, a
trama inaugural ganhara mais agilidade e um formato mais didático. As letras de
Arievaldo Viana têm a sala de aula como foco.
“Minha
alfabetização foi feita com a coleção de cordéis da minha avó. Acredito na
força formativa da literatura de cordel. Não há criança que resista à
fantasia”, argumenta o poeta popular. Amigos pra mais de 10 anos, Arievaldo
Viana e Jô Oliveira desenvolveram “O Romance do Pavão Misterioso” a quatro
mãos. Também afeito aos pincéis e tintas, o cearense fora apresentado ao
pernambucano pela trama de José Camelo de Melo Resende. “Logo de cara, ele me
falou do projeto de fazer uma versão em quadrinhos do folheto. A idéia acabou
se transformando numa série de selos para os Correios que foi até premiada no
exterior”, lembra Arievaldo Viana. “Passamos anos sem nos encontrar. Em 2003,
topei ao acaso com o Jô e ele me falou que tinha publicado uma adaptação em
prosa do romance, mas que não tinha gostado do resultado. Então, me propôs que
eu passasse aquele texto de volta ao formato do verso, à poesia”, explica o
processo.
O desafio
estava lançado. O que nasceu no universo da oralidade e encontrou abrigo nas
páginas fez-se imagens para retornar uma vez mais ao plano da literatura.
“Baseei a minha releitura mais pelos desenhos do Jô do que pelos versos que conheço
desde menino. As ilustrações já carregavam nelas uma certa adaptação. O Jô, por
exemplo, muda o nome do inventor do Pavão. Eu aceitei essa mudança, rompendo
com o original do José Camelo. Também o Jô ressalta mais uma dimensão
nordestina da trama”, pontua Arievaldo Viana.
De 1923,
quando chegou ao papel pela primeira vez, ao século XXI, “O Romance do Pavão
Mysterioso” continua sendo um belo incentivo ao engenho. “É uma história que
prova que a invenção é capaz de tudo. Não há força, não há arma, não há poder
que seja capaz de vencer uma boa idéia”, resume o poeta cearense, agora mais
encantado que nunca com a narrativa. Arievaldo Viana acredita que aí esteja o
motivo maior de explorar o folheto com estudantes das séries iniciais. “É um
período no qual a formação pede esse tipo de estímulo. A questão é apenas de
favorecer o acesso. Até hoje, nunca encontrei um menino que não se interessasse
por literatura de cordel”, observa. Avoa, imaginação. Avoa.
Magela Lima
Repórter POESIA
Publicado
em 6 de maio de 2008 - Caderno 3 - DN
"O Pavão
Misterioso"
30 páginas -
2007 - Editora Imeph
Arievaldo
Viana e Jô Oliveira
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