O DISCO DE ESTRÉIA DE BELCHIOR
Continental, 1974 (Mote e Glosa)
Criei esse texto a partir de um desafio que me foi feito via Facebook pelo professor Washington
Castro: postar dez discos que a gente ouviu até a agulha furar o vinil, e
continua ouvindo até hoje. O oitavo álbum escolhido é o disco de estréia de BELCHIOR, pela gravadora Continental, em 1974. Trata-se de um álbum histórico, cheio de referências à CANTORIA e ao CORDEL.
E, de quebra, falo também de seu/meu parceiro Jorge Mello.
E, de quebra, falo também de seu/meu parceiro Jorge Mello.
A
primeira canção de Belchior que prendeu a minha atenção foi o hit “Medo de
avião”, lançado em 1979 pela WEA. Nesse tempo havia umas máquinas de ficha que
tocavam a música que a gente escolhia no painel. A ficha custava centavos...
Nessa época eu residia em Maracanaú, próximo à estação ferroviária, e bem na
esquina da rua que desaguava no Instituto São José, colégio onde eu cursava a
sexta série, havia uma dessas máquinas cheia de sucessos da época: Gilberto
Gil, Frenéticas, Fagner, Belchior, Sidney Magal, Raul Seixas e Gonzaguinha
estavam entre os artistas mais tocados. Eu ficava olhando aquilo tudo com olhos
de menino pobre, longe da família, vivendo na casa alheia com dinheiro curto,
que mal dava para o lanche da escola e a compra de algum material escolar. Mas
sempre sobrava algum trocado e eu colocava a ficha naquela engenhoca para
escutar MEDO DE AVIÃO. Achava a introdução lindíssima e o timbre de voz do
cantor me recordava a toada dos violeiros e o aboio do vaqueiro sertanejo.
Quando
pude comprar meu primeiro toca-discos, tratei de adquirir um disco desse grande
artista cearense e o primeiro que me caiu mãos foi “BELCHIOR – UM SHOW – 10
ANOS” com regravações de seus sucessos, álbum lançado em 1986 pela Continental.
Estranhei os arranjos da regravação de “Medo de Avião”, embora tenha uma levada
bem contagiante. Mas a música que eu realmente curtia (e ainda curto) nesse
disco é “Canção de gesta de um trovador eletrônico”, parceria do sobralense
Belchior com o piauiense Jorge Mello, seu parceiro mais frequente ao longo da
carreira. A regravação dessa música supera a versão original, lançada no álbum
“Cenas do próximo capítulo” lançado por Bel em 1984. Então tratei de adquirir o
álbum de 1979 para ouvir “Medo de Avião”, “Tudo outra vez”, “Comentário a
respeito de John” e “Conheço meu lugar” na sua versão original. Eu trabalhava
na Rádio Uirapuru de Canindé (atual Rádio Jornal AM) e na discoteca da emissora
havia o antológico “Alucinação”, lançado pela PHILLIPS em 1976, considerado seu
melhor trabalho pela maioria dos fãs.
Xilogravura: ARIEVALDO VIANNA
O
ÁLBUM ESCOLHIDO
Depois
de pensar, comparar e avaliar, resolvi escolher outro disco formidável, seu álbum de estreia, lançado em 1974 pela
Continental, disco que já sinalizava todo o seu potencial criativo.
Bel
abria o seu primeiro disco em 1974 entoando “…É
o novo, é o novo, é o novo, é o novo..”. O álbum que leva o seu próprio
nome como título, ficou conhecido entre os colecionadores de discos como “Mote
e Glosa”, música que abre o álbum e anunciava, mesmo que sem intenção, o
aparecimento de uma nova estrela da música brasileira que emocionava com suas
composições. Na sequencia vem “A palo seco”, “Senhor dono da casa” e “Bebelo”,
uma faixa experimental com arranjo bem ousado sobre um poema concreto. Mas
nesse gênero nada supera “Máquina I” e “Máquina II”, ambas do mesmo álbum: “Êêêê-me-a-MA-quê-u-i-QUI-ene-a-nê-a-NA...
Máquina-maquina-máquina-maquina...” Belchior é quem tomou conta da direção de
produção do álbum, com arranjos, direção artística e regência do incrível
Marcus Vinicius.
O
parceiro Jorge Mello lembra muito bem esse tempo de vacas magras, quando morava
com a esposa e o amigo num kitnet, no
Rio de Janeiro. Depois Belchior seguiu para São Paulo, sem dinheiro no banco e
sem parentes importantes, e foi morar de favor na casa de um amigo, que estava
em reforma, ocupando um dos últimos quartos da casa, embalado pelo som produzido
por pedreiros e carpinas que trabalhavam na obra. Enquanto isso, Jorge Mello
idealizava seu primeiro álbum, intitulado “Besta-fera” que é uma tijolada em
matéria de som e poesia. Mas foi no álbum seguinte, “Integral”, lançado em
1977, que Jorge Mello acertou a mão valendo-se de toda nordestinidade dos
cantadores, dos cordelistas, dos aboiadores e dos sanfoneiros de pé-de-serra.
Seria uma injustiça falar aqui de Belchior sem citar esse parceiro, que foi
também seu sócio na gravadora Paraíso, um selo que lançou diversos artistas no
mercado.
Segundo
seu biógrafo Jotabê Medeiros, autor de “Belchior – Apenas um rapaz latino
americano” o artista seguia a pé para o estúdio onde gravou o seu primeiro
disco.
O
álbum traz 11 músicas que são de autoria do próprio Belchior, que entre elas
destacam-se “Passeio”, “Na Hora do Almoço”, que foi vitoriosa no IV Festival
Universitário da Música Popular Brasileira, e também o grande sucesso “A Palo Seco”.
Neste
disco, Belchior deixa explicito nas melodias a sua raiz nordestina e, como
sugerido no título da primeira música, o cuidado e valorização das letras.
Músicas:
LADO A
1. MOTE E GLOSA
2. A PALO SECO
3. SENHOR DONO DA CASA
4. BEBELO
5. MÁQUINA I
LADO B
1. TODO SUJO DE BATON
2. PASSEIO
3. RODAGEM
4. NA HORA DO ALMOÇO
5. CEMITÉRIO
6. MÁQUINA II
Nenhum comentário:
Postar um comentário